Foi pela música Easy que cheguei aos Minta & The Brook Trout, grupo liderado pela cantora, compositora e multi-instrumentista Francisca Cortesão. Trata-se de uma canção calminha que começa com um acorde prolongado me lembrando Walk on the Wild Side, do Lou Reed, e segue outro rumo. Impossível não parar e ouvir o que mais tinha ali. Depois de ouvir Halfway True soube que entraria num relacionamento sério com a malta.
E o que tocam os Minta & The Brook Trout? Francisca apresenta:
Para quem não nos conhece de todo, gostava de acreditar que temos um bocadinho de Yo La Tengo, de Breeders e de Broadcast.
Nerds e doces, em resumo.
Francisca Cortesão nasceu em 1983 no Porto e hoje vive em Lisboa. O envolvimento com a música veio cedo, travando uma leve “batalha” entre teclas e cordas.
Comecei por aprender piano, da forma mais clássica, aos dez anos. E pouco depois fui aprendendo guitarra (violão) sozinha e com amigos: o que levou uma batalha entre os dois instrumentos. Na altura, venceu a guitarra. De uma maneira muito intuitiva, fui também ‘escrevendo’ as minhas primeiras canções enquanto ia aprendendo a tocar guitarra - Francisca
Em meados dos anos 2000, assim como boa parte dos jovens que faziam música e queriam compartilhar suas gravações, ela colocou umas canções no MySpace sob o nome de Minta, tirado de uma das personagens de Virginia Woolf no livro Ao Farol. Com ele lançou o EP You, com 5 músicas.
O projeto solo ganhou parceiros e novo nome: Minta & The Brook Trout. A banda se tornou o principal projeto de Francisca e este ano eles lançaram o 4º disco, Demolition Derby. As canções vêm com mais palavras, na tentativa de digerir sentimentos, fim de relações, (re)começos, tudo o que vamos deixando pelo caminho e, como ela disse em algumas entrevistas, são também um “bocadinho apocalípticas”.
Francisca conta que quando começou a gravar suas músicas, lá em 2006, já imaginava que faria música por muito tempo, “mas dificilmente teria imaginado tudo que foi acontecendo até agora”. Ela se refere aos diferente projetos e parcerias que construiu na carreira nesses 15 anos. Cofundou os They’re Heading West e entre colaborações passadas e presentes já tocou com nomes da cena atual (Benjamin, Bruno Pernadas, etc), com ícones do rock português (Lena d’Água), além de compor para outros artistas. Um movimento que ela vê com bons olhos.
Da minha perspetiva, parece-me que isso é bem mais comum agora do que quando eu comecei a ouvir música ativamente e a começar a tocar e a compor, em meados dos anos 1990. E acho que se tem ganho muito com isso. No caso de Minta & The Brook Trout, a formação é variável desde o início. E, apesar de ser muito raro tocar sozinha, também acontece. Prefiro sempre tocar com outras pessoas, e tenho tido muita sorte com quem tem vindo a gravar e a tocar as ‘minhas’ músicas ao vivo – Francisca
Ao nome Minta, dos tempos solo, juntou-se ‘the Brook Trout’ para incluir a banda que “não demorou a formar-se”.
Achei que Brook Trout tinha graça por não se perceber se era singular ou plural (porque sou uma nerd de letras, nitidamente). É um nome muito complicado e difícil de dizer, confesso que gostava de ter tido uma ideia melhor! - Francisca
DISCOS E ALGUMAS CANÇÕES
O Minta & The Brook Trout tem na bagagem quatro discos e três EPs. O mais recente é Demolition Derby (2021). O nome do disco foi inspirado em um "esporte" praticado nos EUA, em que carros já muito danificados são reunidos em uma arena para se destruírem ainda mais, segundo Francisca, uma metáfora sobre a violência e destruição gratuitas dos dias de hoje.
É um disco de uma banda que já se conhece muito bem, e que está confortavelmente a experimentar ‘vestir’ cada canção da melhor maneira. De resto, é um disco curto – acho que dá para ouvir inteiro sem cansar! Sinto que as composições e as melodias não são muito mais complexas do que as do nosso disco anterior, o Slow (2016), mas cada uma das músicas tem mais camadas de som do que era habitual. Demolition Derby é um disco menos minimalista – Francisca
Matador foi a primeira música a ser escrita para o disco, ainda em 2018. Foi lançada como single para anunciar o álbum.
Ouvindo-a agora, percebo que estão lá muitos dos assuntos que percorrem todo o álbum: paisagens artificiais, a relação com a passagem do tempo, autoilusões e desilusões e, finalmente, uma tentativa de fazer as pazes com um certo tumulto interior. Matador podia referir-se a um toureiro, a um modelo de carro ou a uma editora discográfica que me é muito cara. Mas no caso refere-se a um modelo de órgão fabricado pela Farfisa, em que toquei pela primeira vez a linha de órgão que veio a transformar-se nesta canção. Na versão do disco, a linha original continua lá, a aparecer e a desaparecer, mas acabou por nunca ser gravada num Matador – Francisca
O Farfisa Matador foi produzido no início da década de 1970. São órgãos compactos com alto-falante e amplificador integrados. Dão esse tom retrô, além de serem super charmosos:
O primeiro disco, que leva o nome da banda, saiu em 2009. Os olhos se voltaram para as composições de Francisca, rendendo comparações com Feist e Aimee Mann. Com 11 faixas, o disco mostrava o DNA do grupo: solos delicados, atmosfera calmante e letras descrevendo sentimentos, mas sem fazer ode a tristeza.
Entre EPs no meio do caminho, em 2012 lançaram mais um longa duração, Olympia, com canções mais melódicas e mais instrumentos. Na definição de uma ouvinte no Bandcamp: um disco que “massageia a nossa imaginação”. Ouça Falcon e The Right Boulevards. Em 2016, saiu Slow, disco com 11 canções que não fogem ao caminho trilhado até então.
Cantando sempre em inglês, Francisca diz que não foi bem uma escolha, mas o caminho por onde as composições fluíram e que ela vê como “ a língua certa para as canções de Minta”. E como nascem as canções de Minta?
Acho que componho quando tenho uma ideia, por muito circular que esta resposta possa parecer. Ou seja, há um pensamento ou uma preocupação qualquer que se insinua e que, às vezes, consigo transformar numa canção. Depois, também me motiva escrever canções para poder trabalhá-las com a banda, para poder ir gravando discos com eles, que é uma coisa que gosto mesmo muito de fazer – Francisca
Discografia
EP You (2008)
Minta & the Brook Trout (2009)
Carnide (2011)
Olympia (2012)
EP Out of Washington State (2013)
Slow (2016)
EP (2017)
Demolition Derby (2021)