A história de como tudo começou não é muito diferente das de outras bandas que já passaram por aqui: estudantes em tempos de universidade, lá pelos idos de 2016, montam uma banda e, depois de um tempo, decidem mudar os rumos musicais. Nascia assim os Ditch Days, expressão que na falta de uma melhor tradução, significa "dias para descomprimir, escapar".
Nessa ideia, Guilherme Correia (guitarra elétrica), Luís Medeiros (voz e baixo) e José Crespo (teclados) se uniram para fazer canções entre o dream-pop, o rock alternativo dos 90’s e o indie, agora já com dois discos (e alguns singles) na bagagem: Liquid Springs (2016) e Blossom (2022).
A inspiração para o nome surgiu da forma mais literal possível. Eu e o Crespo andávamos a baldar-nos às aulas na faculdade para escrever músicas e tocar. Foram mesmo vários ‘ditch days’ seguidos. Esteticamente, o nome já esteve mais alinhado com as nossas músicas, que já foram mais viajantes e escapistas. Agora, com o segundo álbum, Blossom, já procurámos chegar a canções mais diretas e imediatas. Apesar de tudo, seis anos depois, continuamos a gostar muito da sonoridade do nome - Guilherme
Nostalgia é uma palavra que talvez seja chave para entender o primeiro disco dos Ditch Days, muito mais próximo da ideia do nome do trio. São canções sobre escapar (do tempo e do lugar onde se está), fugir da monotonia, se transportar para não estar onde se está. Uma trilha com riffs e linhas de baixo bem construídos, sintetizadores marcantes e perfeita para pegar o carro (como no videogame Gran Turismo) em um dia de sol e sair pela estrada, olhando a paisagem, sem rumo.
As letras com as descrições de espaço nos ajudam a criam imagens e paisagens, e essa atenção ao visual também aparece nos clipes do trio, que fã de cinema, traz narrativas bem elaboradas para os vídeos.
Foram seis anos até o segundo disco, preenchidos com lançamentos de diferentes singles. Nesse período, em 2018, a banda de uma escapadinha para poder compor músicas novas. O trio passou um tempo em Caldas da Rainha, na casa da família de Guilherme, para dedicar-se 100% às novas músicas. Luís lembra que nem os dias de muito frio — a casa não estava preparada para tão baixas temperaturas - inibiram a criação da banda. Para ele, ali escreveram três de suas melhores músicas: Downtown, Even If You Know (feat Terry vs. Tori) e Seth Rogen, baseada em timbres de synths vintages e que leva o nome do ator norte-americano. É a música mais ouvida do trio no streaming.
O nome, como muitos nomes que usamos, surgiu por acaso: estávamos a ver o filme Pineapple Express enquanto tentávamos completar a letra, e o filme acabou por inspirar-nos. Decidimos honrar o Seth Rogen por causa disso. Não sabemos como é que a música acabou por crescer tanto e ser tão ouvida, aconteceu de forma muito orgânica e até já algum tempo após ter saído. O que sabemos é que é uma sensação incrível ter tantas pessoas a gostar de uma música que escrevemos, a ouvi-la regularmente e a usá-la como banda sonora para os seus vídeos e tik toks e coisas do gênero. É muito fixe fazer música que consegue furar e criar mesmo uma relação com as pessoas - Luis
Até 2020 o trio foi trabalhando em singles (alguns deste fariam parte de Blossom), sem o compromisso de lançar EPs ou discos, como em um exercício de criação livre, atentos aos rumos que eles poderiam apontar.
A minha opinião é que deve ser o teu output artístico a ditar o que lanças. Foi sempre assim que tomámos decisões: respeitando o momento em que estávamos e aquilo que sentíamos que seríamos capazes de produzir. Após o primeiro álbum, estávamos com vontade de explorar, não conseguimos chegar a um conjunto de músicas coeso, que fizesse sentido enquanto álbum. A Downtown, a Seth Rogen e a Even If You Know são explorações bastante diferentes umas das outras. Então, na altura, fez-nos sentido lançar essas músicas individualmente. Entretanto, o segundo álbum acontece porque continuámos a escrever músicas e percebemos que existia um corpo de trabalho consistente, de várias músicas que estavam, de uma forma ou de outra, no mesmo comprimento de onda - Luis
Blossom, gravado entre Lisboa-Ponta Delgada-Geneva, saiu em setembro de 2022 e, como o nome sugere (“florescer”, em português), mostra a banda desabrochando. Os primeiros singles Private Eyes, Clementine (composta em francês e cantada pela Laure Briard), The Space Between Everything e Familiar Faces já apontavam uma evolução em termos sonoros. O disco soa mais intimista e traz uma psicodelia mais suave, se assim podemos dizer. Reflexo também do que o trio tem ouvido ultimamente: muito indie pop ("estilo TOPS ou Parcels"), música francesa, nomes como o canadense Sam Evian e Beatles (eles contam que estão ouvindo e estudando as canções do quarteto, "sempre maravilhados com a capacidade de síntese genial do Paul, mas também a arte de quebrar formatos do John e do George").
O disco chega não apenas como um novo álbum, mas é visto pela banda como uma virada de página, por apontar diferentes caminhos, tanto na sonoridade quanto nos temas.
Sinto que estamos menos preocupados em criar cenários, e mais interessados em retratar emoções com as quais todos se podem identificar: paixões, desamores, ir a uma festa onde reencontras antigos amigos, que já nem se lembram bem de ti ou aproveitares aqueles momentos que tens para desligar entre a correria dos teus dias. Essas são as emoções mais fortes, e a música mais pop e concisa acaba por ser um ótimo veículo para chegar a qualquer pessoa e fazê-la pensar ‘ya, também já passei por isto’- Luis
Com Blossom e a rica sopa de influências musicais do momento, o Ditch Days deixa em aberto qual a próxima rota a seguir. Mas pela história da banda até aqui, não há pressa nenhuma em definir a próxima viagem.
Discografia
Liquid Springs (2016)
Blossom (2022)
E o que fazer em Lisboa em um ditch day?
Passear a pé. Umas das melhores coisas da cidade é poderes ir até qualquer lado sem precisar de sacrificar a brisa e atenção ao detalhe que só uma boa caminhada permite - Luis
Pessoalmente, adoro experimentar um dos vários deliciosos brunches espalhados por Lisboa. Tenho o meu preferido, mas é uma dica que fica para uma publicação de turismo - Crespo
Há sempre bandas incríveis a tocar em vários spots de Lisboa, seja no Musicbox, seja na ZDB (Galeria Zé Dos Bois), ou no B.Leza. Se há tempo livre, é para ver gigs - Guilherme